sábado, 7 de junho de 2008

"É fogo! Cada dia que passa eu vejo que a situação piora mais. Mais preconceito, mais reclamações, tudo! Eu não aguento mais, nem meus irmãos! Meus irmãos tadinhos, sendo excluídos da turma por serem do interior. Todos os "amiguinhos" ficam mangando de seu sotaque. Pedro e João todos os dias chegam em casa chorando e reclamando.
Ontem mesmo eles falaram a papai que uma "amiguinha" estava chamando-os de gêmeos caipiras. Papai disse que vai lá resolver.
Sim, papai conseguiu o emprego que tanto queria! Ainda bem que ele conseguiu. Quem sabe assim entra algum dinheirinho aqui em casa para termos uma vida mais confortável?
Por causa disso, fomos para a pizzaria comemorar com seu novo chefe. Estavamos todos ansiosos, claro! Papai todo preocupado, ensaiando o discurso, com um paletó cinza. Minha mãe com aquele seu vestido vermelho e longo, lindo! Os gêmeos com uma calça jeans e uma camisa social. E eu, com aquela minha calça jeans, uma batinha e meu casaco. Todos arrumados, pegamos o primeiro ônibus que vimos na frente. Meus irmãos cantavam e brincavam no ônibus, eu acho que eles têm talento, se alguem investisse neles iriam ficar ricos e famosos! Mas sim, chegamos à pizzaria. Sentamos na primeira mesa que vimos na frente. Minutos depois chegou o Sr. Paulo, o chefe de papai.
-Sr. Paulo essa é minha esposa Dona Helena
- Prazer, seu Paulo
-O prazer é todo meu!
-Meus filhos João, Pedro e Isabel
-Prazer seu Paulo
-Prazer

E ficaram lá batendo um papos sobre o novo trabalho do meu pai e outros assuntos de adultos. João e Pedro já estavam impacientes e foram brincar um pouco. Mamãe reclamava porque eles não estavam se comportando direito. E eu lá, sozinha, por fora. Para minha surpresa, quando olho para trás, adivinha quem eu vejo? Aquele mesmo menino, a mesma cara, o mesmo que disse 'menina do interior'. Aí, só sei que ele ficou me olhando estranho. Me deu um friozinho na barriga, eu só consegui pensar nele o resto do dia. Quem diria, né? Ironia do destino. Levantei-me e fui ao banheiro. Fui me ajeitar. Claro" Com um menino me olhando, eu teria que me ajeitar para não causar mais mal impressão. Quando eu vejo, alguem na frente da porta. Quem? Ele é claro! Nessa hora meu coração batia na velocidade da luz e minha barriga fazia um frio que parecia que estava no polo norte. Eu abri a porta e ele, por sua vez, fica parado, olha para mim e dá um daqueles sorrisos puros dizendo:
- Oi
- Oi
- Olha, é que...é...acontece que...eu queria pedir desculpas por hoje- ele diz rápidamente com uma cara estranha
- Ah, tá, sem problemas. Acho que vou voltar pra minha mesa agora. Tchau. - respondo depois de passar um tempão para decifrar o que ele tinha dito.
Entrei no banheiro, ajeitei-me um pouco. Vi que não havia mais nada o que fazer com minha beleza exótica. Mesmo tentando desfarçar, quem é feio é feio de qualquer jeito.
Voltei para mesa e entimidada não olhei mais para ele, que estava ali tão perto.
Depois fomos para casa. Não pensei mais em nada naquele dia, somente naqueles olhos castanhos me olhando profundamente quando eu disse " sem problemas".

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